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Nascida em São Paulo, em 20 de janeiro de 1931, cursou Direito, Filosofia e Dramaturgia. Escreveu e produziu trabalhos para teatro e televisão, entre os quais Vila Sésamo, Malu Mulher e Joana. Publicou livros de poesia, prosa, teatro e ensaios. Foi professora da Escola de Comunicações e Artes (ECA) e da Escola de Arte Dramática (EAD) da Universidade de São Paulo, além de ministrar cursos de dramaturgia no Brasil e no exterior. Desde 1988 faz parte do corpo docente da Escuela Internacional de Cine y Television de San Antonio de los Baños, em Cuba. Coordenou e participou da Anthologie de la poésie brésilienne, publicada em Paris, em 1998, e que reuniu quatro séculos de literatura brasileira. No mesmo ano, integrou o júri do Prêmio "Casa de las Américas", em Cuba. Vive em São Paulo e às vezes em Atibaia.

Poemas



ALGUMA COISA
Alguma coisa fica
do caminhar contínuo
e deste sono.
Alguma folha fica
da primavera
no outono.
Algum fruto, algum gesto, alguma voz.
Alguma coisa frutifica.
E fica em nós.


CEREJAS, MEU AMOR
Cerejas, meu amor,
mas no teu corpo.
Que elas te percorram
por redondas.

E rolem para onde
possa eu buscá-las
lá onde a vida começa
e onde acaba

e onde todas as fomes
se concentram
no vermelho da carne
das cerejas...


INVERNO
Parece de metal a noite destas ruas.
Os homens estão quietos nos portais.

A luz corta. A esperança não desperta.
Esqueceram acesa a lãmpada da porta.

Donos cobrem de lanças os espaços,
de espadas os desvãos e de lama
os jornais.
Amanhã com certeza os bancos se abrirão.
Por que não? Será um dia como os outros
cheio de transversais e comerciais.

Apagou-se a fogueira dos choferes.
A madrugada roxa parte o coração
dos pombos
dos meninos
das mulheres.

Onde é que toda essa gente se banha?
Que será deles todos?
Para qual
deles alguma vida se fará?
Para quem se abrirá alguma fresta?

Folhas de vidro as árvores.
E eu
estou voltando de uma grande festa.
Merda! Só isso.
Estou voltando
de uma grande festa.


VIAGEM
Faço uma viagem
quase sem sentido.
Preparo a bagagem.
Mas por que motivo?

Nada me motiva
salvo um emotivo
grave coração
que me olha nos olhos
e diz: tens razão.

Vai e sem motivo.
Antes sim que não.

A UM HOMOSSEXUAL ASSASSINADO
Adestravas cachorros.
Provavelmente nunca te morderam.
Hoje estás para sempre debaixo da terra
morto por homens
que adestram
demônios.


ESTA CANÇÃO
"Aquilo que é, já foi; e aquilo que há de ser já foi; Deus fará vir outra vez o que já se passou." (Eclesiastes, 3:15)

Esta canção tateia a tarde clara
buscando a minha voz que é sua fonte.
Assim voltam os pássaros ao campo,
assim volta o horizonte ao horizonte.
Sou o doido que canta para si,
cônscio de não saber nem do que inventa;
recriando o criado, ele sorri,
ciente de que não faz nem acrescenta.
Tudo já foi, apenas se repete;
este lugar de amor será pregresso
quando for dor a dor que se promete.
Chegou-me agora o que já foi futuro;
assim Deus me prepara o teu regresso
como se planta um poema nascituro.